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quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

PRISCILA COMEU AS PINHAS DE NATAL...



O espírito natalino sempre foi muito tocante para mim. Olhava nas ruas os enfeites luminosos, os arcos e guirlandas nas portas, renas de neon nos edifícios e temas harpeanos ecoando nas lojas...  

Mas as festas de Natal em si, embora amorosas e agradáveis,  traziam doloridas ausências. Faltava sempre alguém à mesa. Um tio, a mãe de um cunhado, o irmão amado. Fragmentos de imagens do passado que me davam um aperto danado.

Este ano o tom da nossa decoração foi mudado. Mais modesta, sem muitos requintes. Resolvi apostar na simplicidade.

Nada de árvore ou presépio gigante. Nem decoração barroca para uma fé ainda pouca. Nada de bolas douradas, enfeites de purpurina e laços de fita brilhantes. Era simples a manjedoura. Um pouco de feno e algumas pinhas bastavam. Cristo em mim falou mais alto. Decidi por madeira e simplicidade.

Voltei do interior com um saco de pinhas novinhas, colhidas do chão de terra vermelha sob os pinheirais de Biritiba. Havia tempo que eu não fazia algo assim. Arranjei feno, armações de arame e madeira. E Reis magos comprados em um carrinheiro, numa feira.  

O presépio simples, rústico e com pouco dinheiro montei perto da cortina. Sem perceber que Priscila, a nova integrante da família olhava de fino com interesse leporino para as pinhas fresquinhas.

Numa escapada noturna, sem o nosso olhar de censura, lá se foi o natalino cenário, com as pinhas roídas até o talo. O feno, espalhado pelo chão. Só o Jesus de madeira ficou intacto. Deus, achando graça da sua criação...

Os Natais mudaram. Muitos se foram. Outros chegaram. Papai Noel anda meio sem graça. Priscila ganhou espaço. Natal de novas certezas e outros tipos de laços. Mas veio com alegria e pureza. Mesmo com todo o embaraço!

 

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FELIZ NATAL, CHEIO DE PAZ...

PARA TODOS OS AMIGOS E LEITORES

DO INESPLICANDO!

 

 

 

 

 

terça-feira, 16 de novembro de 2021

BANDEIRA, NO DIA DA BANDEIRA!



Era um peso danado ser a primeira da classe. Eu carregava um misto de vaidade com aborrecimento. A auto-exigência de ter as melhores notas, o melhor comportamento. Pra que tanta cobrança assim, pequena curumim? Hoje, não cobro nada tão serio de mim. Fui assim até meus dezesseis ou dezessete anos. Eu mirava a perfeição. Nove, eu aceitava. Oito, era decepção.

No dia da bandeira, a escola inteira se preparou para a festa. Enfeites, bandeirolas, fitas, professorinhas ufanistas. E eu, a primeira da lista. Escolhida para declamar a poesia de Manoel Bandeira. Foram dias e dias ensaiando café com pão, café com pão, café com pão. Virgem Maria que foi isso maquinista? Agora sim, café com pão, café com pão. Eu torrava o pão e a paciência dos meus irmãos, recitando em casa, o trem da repetição. Café com pão, café com pão. Eu queria a perfeição. Eu era tão exigente...

No dia da festa, o que era certo entortou. Perdi a hora. O despertador falhou. Às sete, a cerimônia começava. Levantei sete e meia passada. Saímos, minha mãe e eu, em disparada.  Roupas, às pressas colocadas, cabelo mal penteado, cara mal lavada. Corremos pelas ruas, desvairadas.  Passa poste, passa boi, passa boiada... Era o próprio trem de ferro em disparada para conseguir chegar ao menos antes da festa terminar. Eu, que era tão exigente...

Ao nos ver no portão da escola, com ar de súplica e esbaforidas, Dona Margarida, minha generosa professora pediu à diretora que encaixasse minha apresentação antes de encerrar a manhã festiva. E lá fui eu na frente de todos, reunindo a coragem que restava e com toda a força na fornalha, declamei o poema, sem muita interpretação...

Café com pão, café com pão, café com pão! Piuiii... Todos aplaudiram. Cantaram o hino, enquanto eu olhava no alto do mastro, a bandeira verde amarela que como eu, ainda tremulava.  

Teria sido uma vitória.  Não para mim.  Eu me daria uma nota três.  Eu era tão exigente...

 

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terça-feira, 9 de novembro de 2021

A PRIMEIRA VEZ... É AZUL!


As pernas eram finas e magrelas. Quadriculadas em azul, efeito do vento frio vindo do sul. Mas saltavam contentes espalhando água pro alto e pra frente. Era a primeira vez que as crianças viam o mar. Num dia feio pra danar.

Foram longos meses de espera. Anchieta ou Estrada Velha? A rota antiga era mais bela. Curvas sinuosas, cachoeiras e mirantes para olhar o alto da serra. Além dos pontos de parada e os marcos da Independência. Rancho da maioridade. Calçada do Lorena. E o pouso Paranapiacaba, provável parada de Dom Pedro ensaiando o grito e lustrando sua espada, já sem muita paciência.

Decidiram pela via Anchieta. Mais rápida e segura. Afinal, tocar o mar era a esperada aventura. Em cada curva da pista, o horizonte azulava a vista. Ora ao longe, ora ao fundo. O oceano Atlântico, vasto e profundo.

No meio da serra já pesava a atmosfera e os meninos sorriram quando seus ouvidos  entupiram. Prende o nariz e assopra, disse o pai, que o ar faz a troca!  Logo mais estaremos ao nível do mar. Praia a vista! Sol, areia branquinha e lindas conchinhas.

Não é que o tempo virou? A praia ficou cinzenta, o mar calmo encrespou e o dia quente, esfriou. Os meninos correram para as malas resgatando seus maiôs listrados e de tecido elástico. Com uma fivela de metal do lado. Podemos ir mesmo assim? As alminhas secas e aflitas imploravam.

A mãe, que sempre agasalha sua cria, vestiu os garotos com uma malha grossa e encheu seus corações de energia. E lá foram eles. Blusa de lã e maiô cafona, pular as primeiras ondas de suas vidas. A praia brava não atrapalhava. Nem o cinza do mar. Nem a malha pesada.

Saíram felizes da água enquanto o pai desapontado, lamentava o mar cinzento.

Sabe pai, onde a gente entrou, só naquele pedacinho... o mar estava azulzinho!


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terça-feira, 19 de outubro de 2021

O OVO DO EMU...


Eva me mostrou com naturalidade o emu macho sentado no chão, chocando os ovos no ninho. Rimos, com a malícia feminina, desejando a mesma dedicação paterna nos machos da raça humana. O emu é mesmo uma ave estranha. Não é ema, nem avestruz. É um parente mais baixinho. Simpático. Azul acinzentado e excelente pai.

Conheci um casal de emus que vivem no sítio. O macho estava no ninho há mais de cinquenta dias. Enquanto a fêmea, serelepe, zanzeava pra lá e pra cá. Os emus machos ficam parados sem sair um minuto do lugar. E ainda cuidam dos filhotes depois que nascem, só pra gente se encantar. Sei de alguns homens-emus, mas são raros de se achar...

Eva continuou me mostrando o sítio, enquanto Pietro de três anos falava naturalmente sobre os bichos e reconhecia as árvores do local. Puseram saquinhos nas ameixas e goiabas para a lesma não entrar. Acho que vai adiantar! Vem muita fruta nesta estação. A primavera chegou, espantou o frio, a paisagem coloriu. Só uma árvore mais velha, com a forte tempestade, que partiu...

Quando o relógio toca às cinco e meia da manhã Eva levanta para dar comida aos bichos. Primeiro as aves, pavões, araras, bourkes rosa, faisões... Depois a porca, as tartarugas e perto do meio dia, a barulhenta reunião dos gansos esperando a boia salpicada na lagoa. Sonora alegria, com a chuva de milhos entornando da bacia...  

Pietro sabe o nome de todos os bichos e brinca com os cachorros se embolando na grama. Romeu é o seu preferido. Border Colie tranquilo, com cara de amigo. À noite desmaiando de sono, o garoto não consegue mais falar. E se depender dos pais, por um bom tempo, assim vai ficar. Ele ainda não sabe o que é joguinho no celular.

Eu arrumava as malas para voltar pra casa, quando um ovo me chamou a atenção na mesa da sala. Gigante. Verde, quase preto. Perfeito! Um ovo de emu? Eva confirmou. Pietro nem ligou. Fui buscar um ovo branco de galinha na cozinha, pra tirar uma foto e comparar.

Tchau, Pietro. Obrigada Eva. Quanta coisa eu desconheço da diversa e tantas vezes, exótica natureza.  Eu, com meus poucos poemas e vasinhos sobre a mesa. Olhei com ternura para o Romeu... acho eu vou te levar!

Pietro chorou, o Romeu é meu!

Claro, Pietro. Tudo é seu. E de quem consegue desfrutar. O sítio, os bichos, as árvores, o pomar...

Da Terra, nada se leva. E tem mais... o emu macho pode até chocar, mas quem toma conta do paraiso é a Eva!

 

*                          *                        *

 

 

 


 

 

 

 

segunda-feira, 4 de outubro de 2021

MENINO DEUS...


Ele tropeçava e comia as palavras, tamanha a euforia quando o seu assunto preferido entrava em ação. Os super-heróis! Naquela semana ele era o Capitão América. Com direito a capa e um escudo com estrela azul e vermelha. Corria feito um corisco do quarto pra sala. Criando falas e aparando lanças imaginárias, criando livres movimentos de ação. 

Depois perguntava... O capitão América é mais forte que o Thor? Não sei, Bruno, difícil dizer. Teriam de se enfrentar. O escudo do Capitão América é indestrutível e poderia proteger da clava mágica... O pequeno Bruno saia pensativo, refletindo e voando pelo quintal com aquela força estranha e cheio de magia. Vestido de infância, personagens, fantasia.

No dia seguinte, a cena se repetia e ele perguntava, agora para a mãe. O Capitão América ganha do Homem Aranha? Pode ser que sim. Mas o homem aranha é ligeiro. Talvez escapasse pelas paredes, ileso. Bruno concordou, mas entristeceu.

Largou o escudo no armário e no dia seguinte, com um "esse" no peito, anunciou satisfeito... Eu sou o Super-homem! Aposto que ele vence o Thor, o Homem Aranha, o Batman e todos os heróis ao mesmo tempo. Não tem ninguém com mais poderes que ele, tem? 
Deus! O pai respondeu. E Bruno surpreso... O que ele usa? Ele é invisível. Ele tem super poderes? Ele faz milagres, sempre. 

Os olhos do Bruno se acenderam, iluminando seu rosto puro e agora, mais sereno. Na manhã seguinte entrou na cozinha para o café em família. Sem capa, sem espada. Sem escudo, nem nada.

Hoje não tem fantasia? Nem uma pergunta sobre os super-amiguinhos seus? 
-Não! De hoje em diante... eu sou Deus!     



*                                         *                                           *                     

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sexta-feira, 24 de setembro de 2021

EU TÔ NA LANTERNA...

                                                                                            
Penha fica no litoral catarinense. Sua singeleza encanta. Praias rústicas. Recantos de pescadores. Simples e boa vizinhança.   
              
Foi lá, num pequeno farol noturno, que um misto de música e solidão apertou meu coração feito as cordas de uma velha embarcação. Eu repetia feito um mantra suave e delicado, o refrão de uma das minhas letras favoritas... lanterna dos afogados! 

Por anos naufraguei num mar de dúvidas, O local cantado por Herbert Viana era real ou uma metáfora usada com beleza e inspiração, simbolizando uma luz no fim do túnel para alguém perdido num mar de incertezas e solidão? Mais tarde descobri que a “lanterna dos afogados” é nome de um bar, no livro Jubiabá de Jorge Amado. Lugar onde as mulheres dos pescadores esperavam seus maridos com suas lanternas em punho na ânsia de ajudá-los a achar o caminho de volta.

Dizem que algumas delas, em desalento, vagavam mudas e chorosas, mas sem ares de revolta. Outras, ainda em desespero e aprisionadas pelo tempo, mantinham acesas suas luzes e a esperança de ver seu amor voltar depois de muitos anos. Triste mar de enganos. Eles nunca voltavam. Talvez a ideia da canção tenha surgido do livro. Não duvido.

Eu me vi assim, por uns minutos, naquele farol noturno esperando uma embarcação que não vem. Um tempo que demora e não chega. Vendo a tempestade próxima e um mar em desassossego. Só o refrão da canção para me consolar.                        

Continuei no farol com o pensamento além mar. Devo tocar o barco? Esperar? Pedir a Iemanjá para ajudar? Sei lá. Eu estava em Penha. No farol das águas calmas. De noite bonita e sem viúvas aflitas. O que balançava era somente a minha alma aflita.

Olhei com doçura a luz do farol e senti a esperança que vinha nas águas renovadas que chegavam do alto mar.  E feito Herbert Viana e as viúvas em Jubiabá, cantei baixinho, pra eu mesma escutar... 

Eu tô te esperando... vê se não vai demorar!!!.

  

            

 *                       *                       *                   
 
                                  

quarta-feira, 25 de agosto de 2021

DESARRUMANDO A CASA...

Derrubei dois livros abertos suavemente sobre o sofá da sala. Joguei a manta sem muitos cuidados. Juntei três cadeiras e espalhei objetos em desordem na mesinha do lado. Pronto. O toque de liberdade, sem perder o conforto.

No escritório, afastei a poltrona abrindo as cortinas da janela convidando o sol a chegar mais perto. Deixei o notebook aberto.

Adentrei o quarto, amontoei os cobertores criando e redesenhando macias montanhas. Empilhei seis travesseiros. Como se as crianças tivessem brincado por lá o dia inteiro. Aventura pura e sem censura.

Na cozinha comecei o recheio do bolo caseiro. Selecionei os ovos, o leite e a manteiga, deixando uma nuvem de farinha salpicada em neve sobre a mesa.

Desci do armário quatro taças de vinho, as preferidas dos amigos. Completei o cenário, abrindo todos os vidros da varanda pra que a brisa balançasse alvoroçando as plantas. Queria o movimento. Alegria, mais que vento.

Depois, liguei o rádio cantando alto um velho e conhecido refrão. Queria o coro, não um solo de violão.

Pronto. Sinais de vida alterando o silêncio das coisas. Movendo as roupas, empilhando as louças.

Enchendo minha alma de presenças e esperanças.      A casa... delicadamente desarrumada.

 

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terça-feira, 17 de agosto de 2021

ATENDE. É O PREFEITO!

 
                    

Passei muitas temporadas de férias na cidade de Itanhaém quando pequena. Graças a um tio que tinha uma linda casinha com uma rampa de pedrinhas, na rua que dava na praia dos pescadores. Da cidade em si, lembro pouca coisa...

Recordo a antiga ponte de madeira. A cama de Anchieta. A estátua de Mulheres de areia e da novela em sua primeira versão, com Eva Vilma, Ruth e Raquel, e Guarnieri como Tonho da Lua. Além de alguns personagens da rua...

Lembro mesmo é do Seo Alcides. Que eu pensava ser o prefeito da cidade. Na verdade, ele dirigia o caminhão da coleta de lixo, mas meu tio insistia em chamá-lo de “prefeito”. Grande sujeito. E tinha a panca e a autoridade do fictício cargo. Moreno, cara redonda. Um homem forte e meio calado. Metia medo na garotada. Morava na rua em frente à casa do  meu tio e tinha uma esposa, cujo nome, minha memória seletiva, deixou escapar...

Passei inúmeras tardes sentada na varanda da casa do Seo Alcides, que tinha um carinho especial por mim, a menor de todas as crianças que passavam férias em Itanhaém. Éramos muito amigos. O prefeito e eu! Depois de anos, eu já adolescente, meu tio contou uma história que surpreendeu...

No meio de uma importante reunião da Fiesp, repleta de diretores e executivos da indústria. Meu tio era pressionado pela queda das vendas, numa calorosa discussão sobre mercado e crise financeira, quando foi interrompido pela nervosa secretária que adentrou a sala com o velho telefone de fio na mão:  -Sei que não devia interromper, mas acho que o Sr. Diretor vai querer atender. Ele disse que é urgente! É o prefeito de Itanhaém...

Meu tio, rápido e astuto, tirou o telefone das mãos da secretária e atendeu prontamente com ares de poder... O que é que há? Diga lá, prefeito! Pode falar...

Era o Seo Alcides, o motorista do coletor, parando a reunião da Fiesp!


*                  *                   *                


EM BREVE...

INESPLICANDO... COM NOVIDADES!

AGUARDE!

quarta-feira, 11 de agosto de 2021

O BONDE E A ESPERANÇA...

A Rua João Pessoa é uma linha reta que vai dar no Porto de Santos, cruzando o centro antigo da Cidade. Zona das bocas e da antiga boemia. Dos famosos Love Story e Fugitivo. Região do cais. Notívago caos. 

De dia, o comércio já não cresce. À noite, quando escurece, as mulheres aparecem feito mariposas. E se espalham pelas casas noturnas, salteando alegres entre clientes e copos de cerveja. Som de forró e música sertaneja. 

São muitas. Algumas, atrevidas. Outras simpáticas e coloridas. Expostas! Com pernas à mostra. Porém, mais discretas que os rapazes da General. Com saltos quinze e meias arrastão. De humor ácido e escrachado. Vozes finas e físicos avantajados. 

Conheci alguns desses personagens na saída do trabalho, no lusco-fusco confuso  das sete da noite. Todo cuidado é pouco no velho centro da cidade. Nessa hora tudo se mistura. Trabalhador e meliante. Policial, vendedores, ambulantes. E as mulheres da noite surgem dos casulos ocultos da avenida. Borboletas esvoaçantes. 

O Centro histórico fervilha. Tem cheiro de gasolina e maresia. É a zona do Porto. Beira do cais, onde tudo começa e termina. Rota de muitas vertentes. Entrada dos esperançosos. Saída dos descontentes. 

Foi no meio de toda essa gente que eu vi uma moça na esquina. Cara de menina. Corpo de adolescente. O que fazia? O que tinha em mente? Queria dinheiro ou presente? Passei com meu saquinho de pipoca doce e quente que ela me pediu com o seu olhar. Queria provar. Como quem quisesse, talvez, fugir e brincar.

Estendi a mão e ofereci a pipoca. Ela pegou e sorriu. Guardei na lembrança. O bonde passou. Ela subiu. Segui com o meu saquinho de pipocas quase vazio. Mas no fundo, lá no fundo, achei um grãozinho ainda puro de esperança. Seu sorriso era de criança. 

 

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O UNIVERSO INESPLICANDO VAI FICAR MAIOR!

AGUARDE! 



terça-feira, 20 de julho de 2021

O FEITIÇO DA LUA!

Vinte de julho, bem no meu aniversário, um fulano americano fincou a bandeira na lua como se fosse sua! A lua foi vista nua e crua. Pálida e empoeirada. Sem ar na atmosfera. E com um tecido enrugado de crateras.

O astronauta impiedoso desalmou a lua dos nossos sonhos, Vimos na tevê o vazio abandono. Uma lua metade escura, sem sinal de água e de vida, ainda que branca e linda, vista de longe no escuro do céu.

De criança, deitada num pedaço de chão, eu ia até a lua e voltava num foguete imaginário. Pensamento aéreo, solitário. Gratuito. Expresso-rápido. Desviando de asteroides, deuses e pássaros. Eu chegava perto da lua, sem nela pisar. Bastava me aproximar. Sentir o brilho e a energia que encantavam as noites de luar. Lua amiga e antiga. Dona de raios e feitiçarias.

Depois que o homem pisou na lua, algumas canções perderam a magia. São Jorge e seu dragão partiram pra outro planeta. Não vemos mais a menina do anel de lua-estrela. E a Lua da Luiza, que boiava na estrada nua, não mais flutua. O homem do foguete, desencantou friamente a lua!

Não temos mais o que esperar. O homem faz bate e volta de lá pra cá! Tem até uma estação pra estacionar com taxi-lunar! Esqueçam as quimeras. Ir à lua, virou viagem de férias. Resort de ricos. Puro capricho.

Mas cuidado, astronautas, não sabem do feitiço e o altíssimo custo que terão de pagar.

“Quem na lua pisar, poderá dormir. Mas não mais sonhar”


*                  *                              * 

 

 ATENÇÃO LEITORES! 

AGUARDEM... NOVIDADES INESPLICANDO

PARA A PRIMAVERA!

terça-feira, 13 de julho de 2021

O PINTOR DA AURORA...

Um grande autor se diverte por detrás do planeta. Pinta o céu com ondas róseas. Outras vezes azuis, verdes ou violetas. Névoas que dançam e se espraiam num jogo de luzes no céu. Curvam-se como se valsassem, livres de linhas e pautas musicais. Quem acende aquelas luzes na escuridão polar? Quem é o pintor da aurora boreal?  

No meu telhado imaginário crio os mais lindos e gelados cenários. Alasca, Noruega, Escócia, Finlândia, Canadá. Dizem os cientistas que o sol manda elétrons raivosos em tempestades de ventos. Mas eles se chocam com o campo magnético da Terra que manda tudo pra escanteio. Eu creio! As auroras aparecem nos pólos e não no meio. É tamanha a beleza que deve ter alguém por detrás com certeza....

E o arco-íris, com suas sete cores, saindo das montanhas e mares feito um compasso, fazendo um semicírculo fantástico até o chão. Quem bolou? Quem pintou? É o sol depois da chuva o seu autor. Água, luz, cor, refração.

O rastro do navio na lua cheia também fascina. Caminho prateado cortando a imensidão. Trilho iluminado rasgando o mar em duas metades maciças. A lua é a solitária artista.

Quanto à aurora boreal... Jogo de luzes que pintam o céu em liberdade fria e serena. Deve ser Deus, brincando, com sua lanterna multicolorida... e todas suas luzes de leds acesas!   

 

 

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  "INESPLICANDO"

 Viaje na leitura...

 


 


terça-feira, 6 de julho de 2021

AS BALINHAS DO PADRE...

      
Era mágico e amedrontador entrar naquele prédio antigo e bem conservado do Colégio do Carmo. Portas maciças, grandes colunas e andares amplos onde os padres de batina preta cruzavam as alas com semblantes fechados e austeros. Meus irmãos estudavam lá!

Todos os padres eram sérios. Menos um. O Irmão Martinez. Quando me via, colocava a mão no bolso da batina e voltava com um punhado de balinhas. Ardidas. De hortelã, as minhas preferidas! Depois, com o indicador frente a boca, pedia o meu silêncio. Era doce o nosso segredo.

As aulas de exatas e ciências eram as mais fortes do colégio. Mas havia música e arte. E a peça teatral dos alunos no fim de ano, um capitulo à parte. 

Eles mesmos criavam, produziam e ensaiavam. Geralmente escolhiam uma comédia cheia de graça ou uma sátira de terror. E rezavam para passar pela censura dos padres e do reitor.

No dia da apresentação, os mais velhos e de batina assistiam na primeira fila, com orgulho e atenção. Logo atrás, os amigos, as famílias e eu, que não entendia quase nada, mas me divertia com o riso e os aplausos dos adultos. 

Quando eu cansava, o irmão Martinez percebia. Sentava do meu lado e tirava do bolso as balinhas verdinhas santificadas. Tudo ficava mais doce e o meu "medo de padre" passava mais longe. 

Meu irmão confessou, certa vez, que sentiu muito medo ao falar com o temido e compenetrado Padre Pedro. Foi na primeira missa de sábado, dentro do confessionário. Não tinha feito nada errado, restou inventar um pecado. Pecadinho. Bem levinho. Só pra não ficar chato. 

Depois, voltou com sua pena de sete Ave Marias e um pai nosso! Meu irmão garante que não pecou. Não sei se acredito. Ele voltou muito feliz com o pequeno castigo.

Pra mim, foi merecido!



                         *                        *                                             
     
            
                                                                                






terça-feira, 22 de junho de 2021

GOSTO DE CHEGAR...

Gosto de partir. Porque gosto de chegar...                    

Chegar num outro lugar. Às vezes estranho, diferente. Onde haja novas paisagens e eu possa abraçar gente. Pode ser o lugar de sempre. Chegarei feliz novamente. Há sempre algo meio escondido que escapa ao primeiro olhar distraído. 

Muitas vezes, o tempo cruel e apressado vai deixando tudo mais velho e desbotado. Casarios, fazendas, ranchinhos. Chegarei com os olhos amaciados e mais atenta para olhar com carinho, o velho que ainda se mostra vivo, ainda que puído. 

Não acho triste partir. Porque gosto de chegar... 

O trem me encanta com as oportunidades tantas de descer e conhecer cada estação e seu pulsar. A pacata cidade ribeirinha. O centro com suas vendinhas. A periferia mais pobre. A estação empinada, ladeada por casas nobres... Chego como quem chega numa festa. Olhando e adentrando. Uma feliz penetra. Observando a vida que salta em cada fresta.

Não acho chato partir. Porque gosto de chegar... 

Na minha própria casa, depois da viagem suntuosa. Repousar na minha cama. Tomar banho e me sentir dentro do meu velho pijama. E se tiver que retornar? Volto na outra semana. Chego feliz de novo, feito aprendiz, em novo lugarejo. Conhecendo outros povos, seus sotaques e manejos.

E na viagem final, diante da morte, quando a nossa fé sacoleja com tropeços e incertezas... Vou na calma experimentar! Não tenho medo de partir. Porque gosto de chegar...

O que vou encontrar? Quem vai estar lá? Se tem asas de anjos, quipás ou patuás? Não importa! Vou me encantar.

Mas... não precisa ser já!

 

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quarta-feira, 16 de junho de 2021

A RUA DE TERRA LARANJA...

                    

          

Tudo ficava meio alaranjado. Os pés, as canelas, os braços e o rosto perto do nariz e da boca que com a mão eram tocados. A rua de terra da vizinhança deixava suas manchas de alegria laranja nas crianças... 

Meninos empoeirados jogavam e corriam descalços na frente do golzinho de dois paus improvisados. Eu morava na casa branca da avenida de asfalto. Rua Conselheiro Justino, que se transformou, mais tarde, na gigante Radial Leste. Virando a esquina, na rua de trás, era a rua de terra alaranjada. Pequena, com casinhas de um lado, e do outro, um muro alto de fábrica, de tijolo descascado. 

De dia e de tarde a rua ecoava ruídos humanos. Risos de meninas e meninos brincando até ao anoitecer, quando voltavam imundos pra casa. Minha mãe sorria quando meu irmão, no banheiro, perguntava: o que é pra lavar direito, mesmo? Tudo. Dos pés ao fio de cabelo. Capricha nos dedos e nos joelhos! Às vezes ele pedia ajuda. Bater com o peito do pé na bola de capotão molhada e dura, criava uma espécie de pele cascuda. Lama dura. Tinha que passar creme e esfregar com força e até escovão. Não reclamavam. Era o preço da diversão. 

Segunda feira, os pés já limpos na meia branquinha e com sapatos engraxados, seguiam para o colégio no ônibus do Colégio do Carmo. Era nos finais de semana que a rua de terra fazia valer o seu destino de rua feliz. Lá estavam bons e antigos vizinhos, todos com filhos... Os portugueses e sua varanda de orquídeas. A família italiana com vinhos e cantorias. Os espanhóis da venda de empanadas... e emoldurando toda a rua, a paisagem laranja colorindo os muros e calçadas.

Foram quatro anos sonhando com a rua de terra que eu via na pele dos garotos só de passagem. Eu não tinha idade... Foi na semana das festas juninas que veio o batismo e a inauguração... Pode levar a menina na rua de terra! Mas não descuida um só minuto dela! 

Toda arrumadinha, vestido de remendos e fitas juninas, larguei de pronto a mão do meu irmão e sai correndo pra tocar o chão. Tirei os meus sapatos fechados, estendi os dedos, alarguei os passos e pisei na terra laranja, sujando meus pés limpinhos com deboche e carinho. Depois achei uma poça d’água e coloquei os pés pra enxaguar. A cor laranja se espalhou pelos poros, pelos pés, pernas e canelas... 

Agora eu sabia, de verdade, o prazer que era!


 

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terça-feira, 25 de maio de 2021

BOA VIAGEM... ALEMÃO!


Não é Karl. É Karl-Heinz! Hanna apresentou assim o marido naquela tarde ensolarada na praia de Jurerê. Bastaram alguns olhares e veio logo a pergunta sobre o drink vermelho que os encantou. - Caipirinha de Morango, dissemos! Eles apelidaram alegremente de “ caipirango!”. 

Nascia ali a improvável amizade entre dois casais, brasileiros e alemães. Ela tinha um inglês difícil e germânico e era assistente social. Viajava em missão. Tinha um filho especial. Nos entendemos mais com o olhar fraternal. Karl Heinz era engenheiro de alimentos. Entendia de biscoitos e bolachas. Mas gostava mesmo de velejar e provar do nosso "bom" cachaça. 

Navegamos longas e belas tardes em caiaques de dois lugares. Karl contava dos mares gelados. Da pesca. Dos escandinavos. Oceanos distantes e bravos! Era um alemão branquinho, com bochechas avermelhadas. Nos últimos dias, ardidas e estorricadas.
Karl chegou na praia com camisa de flanela. Xadrez. Manga comprida vermelha e amarela. Rimos muito. Sem abraços apertados, ardiam demais os seus braços. 

Dois anos depois, o casal veio de Brehmen até o Brasil e se hospedou em nossa casa. De manhã, a surpresa. Estava pronta a mesa! Pão. Leite. Café que ele mesmo fez em nossa engenhosa cafeteira. Biscoitos e manteiga que ele achou na geladeira. Hanna sorriu. Karl-Heinz é assim! Tomamos o café e eles tiveram que partir...
 
Não vou esquecer seus olhos azuis e marejados no dia do último abraço. Hoje, folheando o livro que ele nos presenteou, revi a carta indesejada falando da sua partida e da missa de sétimo dia...

Agora as lágrimas são minhas. Lágrimas de água e sal. Feito o biscoito. Feito o mar. Que nos uniu e nos separou. Boa viagem, Almirante Karl... Karl não, Karl-Heinz! 
Tanto faz. As palavras e as distâncias já não atrapalham mais!          



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quarta-feira, 19 de maio de 2021

ORELHA DE PAU?

Meu passatempo preferido é andar pelas ruas da vizinhança observando as árvores e flores que interagem na paisagem urbana. Sempre há uma surpresinha aqui e ali. Uma flor que eu não conhecia. Uma orquídea nova florescendo e sorrindo. Uma ou outra pitanga bem no alto que nenhum atrevido conseguiu pegar de assalto.                  

Sofri ao ver o velho e enorme chapéu de sol, vítima de uma poda destrutiva e desastrosa, se transformar num tronco sem vida. Olhei o tronco com dor, lembrando da sua copa aberta e generosa, alegre e espraiada, agora um pedaço de tronco torto e mais nada. 

Veio a seguir a surpresa inesperada. O tronco pelado estava florido! Enfeitado de branco. Com pétalas grandes encravadas. Pareciam rosas grudadas. Fui me aproximando tentando entender a visão surpreendente. Não achei brotos nem flores, apenas cogumelos estranhos à minha frente! 

Os cogumelos tem aura de mistério e magia. Estão nas lendas e fantasias. Aparecem subitamente em bosques úmidos e sombrios. Alguns são venenosos como os mais famosos de chapeuzinho vermelho e pintas brancas. Conhecido como Amanita ou Cogumelo do Papai Noel. Por conta da sua ingestão, os nórdicos talvez vissem renas e trenós voando no céu... 

Deixei de onda os alucinógenos e fui procurar os tais cogumelos brancos entre as centenas de tipos e diferentes formas. Queria saber o que enfeitava o tronco oco do antigo e exuberante chapéu de sol. Encontrei vários, muito bonitos de se ver. Várias cores e padrões. Alguns bons de comer! 

O orelha de pau foi o que mais se aproximou. Não sei se é ele o cogumelo que nasceu no tronco seco e cheio de rachaduras. Mas me encantou a ideia de ser uma orelha dura. Continuo andando pelas ruas olhando as árvores. Sentindo a dor do corte e da morte de algumas. 

O sol continuará firme e forte brilhando além das tragédias provocadas pelo homem. E depois das chuvas, alguns cogumelos nos darão a breve e fugaz sensação florida de vida e de cores! 

Não foi alucinação. Olhei cogumelos... e vi flores!


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terça-feira, 11 de maio de 2021

O VENDEDOR DE MELANCIAS

A  Avenida Celso Garcia cortava o bairro do Brás até chegar no Tatuapé. Era extensa, cinzenta e com cheiro de fumaça. Carros e ônibus cruzavam barulhentos e vagarosos. Via perigosa para uma pré-adolescente que todos os dias cruzava a passagem para chegar ao colégio. Agora sem a ajuda da mãe. Prova, aparente, de amadurecimento.

Uma coisa destoava daquele cinza tristonho da avenida. O vendedor de melancias que ficava na esquina do Largo da Concórdia. Alegre, falante e nordestino, como a maioria por lá. Às vezes, cantava. Às vezes, assobiava. E cortava com facão afiado e rara habilidade, as fatias de melancias verde-róseas. Pareciam deliciosas, refrescantes e geladinhas. Nunca ousei comer um pedaço sozinha. 

Além da falta de dinheiro, parar numa banca de madeira entre dezenas de homens recostados, alguns trabalhadores, muitos desbocados, era impensável! Havia pouca  higiene e muita poeira dos carros. E se alguém me visse? Crime demais para uma garotinha. Mas aquelas fatias de melancia geladinhas... 

A Celso Garcia foi ficando mais caótica a cada dia. E depois da implantação do corredor de ônibus, tudo ficou espremido. Mais cinzas empoeiravam as poucas árvores que haviam sobrevivido. 

Os retirantes que chegavam aos montes na Estação do Brás viravam ambulantes e se instalaram nas calçadas. Vendiam de tudo. Miçangas, relógios, churrasquinhos, cocada... Às vezes, a polícia baixava. A maioria não tinha licença. Nem perdão! Era uma correria danada.

O Largo da Concórdia era pura discórdia. Um território hostil onde ninguém se entendia. E o vendedor de melancias continuava sorrindo e abrindo suas melancias, verde-róseas, deliciosas...

Uma tarde, na volta do colégio, a cena que parecia impossível. Meu irmão mais velho, com seus vinte anos de idade, chegando da faculdade ao lado do alegre ambulante, com um pedaço de melancia na mão! Sai correndo em sua direção como quem implora autorização. Compra um pedaço pra mim? Foi delicioso aquele... sim! 

Saboreei junto com ele a grande lasca, roendo até o verde final da casca. Comer melancia na avenida Celso Garcia, entre ônibus, operários e cheiro de fumaça... era uma grande ousadia.

 

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terça-feira, 4 de maio de 2021

BONECA À PRESTAÇÃO...

Toda quarta-feira eu ficava pronta. Com a minha melhor roupa. Esperava sentada, próxima à porta. Dia de ir à loja da Dona Cristina. Lojinha pequena e bem decorada. A uns quatro ou cinco quarteirões de onde eu morava. Nas velhas prateleiras, bordados e linhas. Agulhas e novelos de lã. Também havia centenas de botões e fitas entocados nas gavetas. Em destaque, ela, a boneca mais linda da face da Terra! 

Roupa feita à mão. Braços e pernas maleáveis. Cara de porcelana. E dois olhos de vidro brilhantes. A boneca dos meus sonhos! Devia ser cara, na época. Minha mãe bolou um plano fantástico. Vamos comprar a boneca passo a passo. Cada mês, um pedaço. E com a Dona Cristina combinou um tipo mágico de crediário. Mexendo com o meu imaginário.

Eu ia na loja todo mês, acrescentando ao sonho, um novo pedaço. No primeiro mês, o pé direito foi comprado. Depois o esquerdo. As pernas, direita e esquerda. Depois os bracinhos. E a parte central do corpo, com o coração em tecido fino de seda  alinhavado por dentro. Acabamento perfeito. 

No último mês, a parte final, os olhos brilhantes e a cabeça.  – Podemos levar pra casa? Dona Cristina sorriu entregando a boneca que segurei forte em meu peito, como Gepeto, agarrado ao seu Pinócchio.

Se a boneca ganhasse vida, escutaria as alegres batidas do meu coração. Voltamos pelo caminho. Eu, segurando a boneca. Minha mãe, a minha mão. 
Mal sabia ela, mais do que a boneca, me dava a mais linda compreensão.  A felicidade... começa no sonho!



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terça-feira, 6 de abril de 2021

CASA DA JUREMA

Quando eu vi pela primeira vez aquela lagarta verde listrada com duas anteninhas róseas e olhos pretinhos fazendo um movimento ondular na folha grande do vaso, eu fiquei encantada. Criança pequena, segui com alegria aquele serzinho estranho que andava quase desabando e depois voltava à base, folheando. 

Fui chamar alguém que pudesse me explicar o bichinho diferente, com cílios no corpo e cara redonda de gente. Triste foi ouvir que eu não poderia pegar. Ela queima! Como pode? E eu até lhe dei nome... Jurema!

Jurema queima? Jurema é malvada? Jurema é bichinho e não sabe de nada. Apesar do pesar e da distância imposta, simpatizei com a lagarta verde e rosa e todo dia a procurava entre as folhas e caules. Tinha dias que dormia e não se mexia. Outras vezes, comia e me deixava observar. Fazia buracos nas folhas, minha mãe não iria gostar. Eu protegia a Jurema. Jamais iria contar. 

Foram semanas na companhia da lagarta estranha e seus passeios divertidos. Eu me via nela, olhando as folhas gigantes por ângulos invertidos. E me preparava, também, para o desconhecido.

Num dia cinzento, Jurema desapareceu. Jurema partiu? Morreu? Quem matou minha lagarta? Meu olhar não se aquietou até encontrar a estranha casinha. Um casulo de seda amarronzado no meio do vaso. Lá estava ela e se preparava para se transformar. Virar borboleta! Linda, com duas asas e voar...

Jurema não deu pistas. Não deu na vista. Esperta, me seduziu e se recolheu. Esperou o tempo preciso. Não adiantava acelerar. O tempo no casulo é o tempo certo do maturar.

Domingo cedo comecei a ver Jurema quebrando a sua crisálida e botando a nova cara, ávida, pra fora do lar. Agora tinha outro corpo. Asas moles se desdobraram até endurecer. Tinha novas cores, olhos e desenhos. Foram duas ou três horas observando o processo lento. Privilégio de criança, que não se importa com o tempo.

E Jurema voou. Dei tchau com minhas mãozinhas pequenas e ela partiu cheia de graça. Deixando a lembrança da sua amizade... e o meu sorriso, de ainda... lagarta!

 

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