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sábado, 25 de fevereiro de 2017

NA PASSARELA... DO HOSPITAL

 
Sábado de carnaval. Não me levem a mal, mas não era ali que eu queria de estar. Ala dos enfermos e cardiopatas. No meio de anginas, taquicardias e infartos do miocárdio. Pressão muito alta!  
Na entrada, o bloco do avental azul, cada um com seu paciente na maca. Abriam alas e salas, desfilando na passarela do velho hospital. Meu coração batia feito tambor. Ansiedade pedindo passagem...Veio a ala dos doutores. De branco, com seus adereços de mão. Estetos, medidores de pressão, pranchetas e papéis de exames. Era uma ala de respeito. Mestres da velha guarda com seus cabelos grisalhos. Deu um certo sossego.
A ala mais simpática era a das enfermeiras. Algumas delas, cheinhas, com seus jalecos brancos, cruzavam de lá para cá com leveza e boa evolução. Tudo dentro da marcação dos eletros. Compassos monitorados. Tum-taques perfeitos e desejados. Pra ninguém entregar os pontos na avenida!
Do lado de fora e com o coração na mão, eu acompanhava o senhor Antonio tentando manter a pressão, focando no piso da passarela. Eu passeava de lá pra cá, decorando a sequência dos velhos azulejos portugueses que iam dar na ala da nova guarda do hospital, em piso xadrez azul e branco bem atual.
No final da bateria, a arritmia não passou de um susto. Estresse desta vida insana e da competição desmedida. Soma fatal de metas, rapidez e perfeição. Pobre coração. Agora um rivotril, aspirina e tudo fica bem. A partir de agora, vida Zen!
A carnafolia no hospital terminou no batuque frenético do plantão central. Sem plumas. Nem confetes. Só tubos e catéteres. No final, alegria geral. Evolução nota dez! 
Estamos de alta, comentei com o Senhor Antonio, ainda na maca... Eu vou lembrar do chão desta passarela. Seo Antonio olhou para mim e depois olhou pro alto como quem fala com Deus um papo reto ...
- Eu vou lembrar só do teto! 
 
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sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

O QUE TOCAM... OS ANJOS?

  

O som dos sinos quando dobram, se multiplicam dentro de mim. É coisa por dentro. Reverbera na alma. E nesse ritmar retumbante, imagino sempre que tipo de anjo deve tocá-los... Um anjinho solitário, acredito. Anjinho daqueles gordinhos de cara triste, que pendurado numa corda, pula de lá pra cá fazendo soar o campanário. 

Acho que é porque esses anjinhos que tocam sinos de igreja ouvem muitas queixas...Gente que perdeu gente querida. Gente que faz promessas para curar doenças. Gente que sofre por pouca ou muita coisa. E outros temas mais complicados. Por isso eles são assim... Ágeis, porém introspectivos. Como os sinos dobrando dentro de mim. Já os anjinhos mais alegres devem tocar trombetas. Os intelectuais, harpa. Nunca imaginei um anjinho tocando um som pesado. Talvez esses não sejam anjinhos ainda. Mas chegarão lá! 

O fato é que nunca vi tanto sino de igreja... Novos, velhos, enferrujados, pequenos, imensos. Nem tantos trens de ferro, quanto na viagem por Minas Gerais. Era assim... O som dos sinos ao meio-dia e às seis da tarde, repicando em meu peito. E o som dos trens chacoalhando todo o corpo e me levando por trilhos desconhecidos, em linhas paralelas no pensamento... Mas, diferente dos sinos, não tinha anjo nas locomotivas. Tinha sim, o velho maquinista, seguindo seu caminho, soltando a fumaça branca e desaparecendo na curva. Deixava na gente somente o som do apito longo e doído... E uma nuvem branca subindo, simplesmente, no azul do céu! 

Aí sim, um anjinho, lá em cima, soprava forte e sorridente. tocando, talvez... clarinete!