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terça-feira, 22 de junho de 2021

GOSTO DE CHEGAR...

Gosto de partir. Porque gosto de chegar...                    

Chegar num outro lugar. Às vezes estranho, diferente. Onde haja novas paisagens e eu possa abraçar gente. Pode ser o lugar de sempre. Chegarei feliz novamente.Há sempre algo que escapa ao primeiro olhar distraído. 

Muitas vezes, o tempo cruel e apressado vai deixando tudo mais velho e esmaecido. Casarios, fazendas, ranchinhos. Chegarei com os olhos amaciados e mais atenta para olhar com carinho, o velho que ainda se mostra vivo, ainda que puidinho. 

Não acho triste partir. Porque gosto de chegar... 

O trem me encanta com as oportunidades tantas de descer e conhecer cada estação e seu pulsar. A pacata cidade ribeirinha. O centro com suas vendinhas. A periferia mais pobre. A estação empinada, ladeada por casas nobres... Chego como quem chega numa festa. Olhando e adentrando. Uma feliz penetra. Observando a vida que salta em cada fresta.

Não acho chato partir. Porque gosto de chegar... 

Na minha própria casa, depois da viagem suntuosa. Repousar na minha cama. Tomar banho e me sentir dentro do meu velho pijama. E se tiver que retornar? Volto na outra semana. Chego feliz de novo, feito aprendiz, em novo lugarejo. Conhecendo outro povo, gostos e manejos...

E na viagem final, diante da morte, quando a nossa fé sacoleja com tropeços e incertezas... Vou na boa experimentar! Não tenho medo de partir. Porque gosto de chegar...

O que vou encontrar? Quem vai estar lá? Se tem asas de anjos, quipás ou patuás? Não importa! Vou me encantar.

Mas... não precisa ser já!

 

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quarta-feira, 16 de junho de 2021

A RUA DE TERRA LARANJA...

                    

          

Tudo ficava meio alaranjado. Os pés, as canelas, os braços e o rosto perto do nariz e da boca que com a mão eram tocados. A rua de terra da vizinhança deixava suas manchas de alegria laranja nas crianças... 

Meninos empoeirados jogavam e corriam descalços na frente do golzinho de dois paus improvisados. Eu morava na casa branca da avenida de asfalto. Rua Conselheiro Justino, que se transformou, mais tarde, na gigante Radial Leste. Virando a esquina, na rua de trás, era a rua de terra alaranjada. Pequena, com casinhas de um lado, e do outro, um muro alto de fábrica, de tijolo descascado. 

De dia e de tarde a rua ecoava ruídos humanos. Risos de meninas e meninos brincando até ao anoitecer, quando voltavam imundos pra casa. Minha mãe sorria quando meu irmão, no banheiro, perguntava: o que é pra lavar direito, mesmo? Tudo. Dos pés ao fio de cabelo. Capricha nos dedos e nos joelhos! Às vezes ele pedia ajuda. Bater com o peito do pé na bola de capotão molhada e dura, criava uma espécie de pele cascuda. Lama dura. Tinha que passar creme e esfregar com força e até escovão. Não reclamavam. Era o preço da diversão. 

Segunda feira, os pés já limpos na meia branquinha e com sapatos engraxados, seguiam para o colégio no ônibus do Colégio do Carmo. Era nos finais de semana que a rua de terra fazia valer o seu destino de rua feliz. Lá estavam bons e antigos vizinhos, todos com filhos... Os portugueses e sua varanda de orquídeas. A família italiana com vinhos e cantorias. Os espanhóis da venda de empanadas... e emoldurando toda a rua, a paisagem laranja colorindo os muros e calçadas.

Foram quatro anos sonhando com a rua de terra que eu via na pele dos garotos só de passagem. Eu não tinha idade... Foi na semana das festas juninas que veio o batismo e a inauguração... Pode levar a menina na rua de terra! Mas não descuida um só minuto dela! 

Toda arrumadinha, vestido de remendos e fitas juninas, larguei de pronto a mão do meu irmão e sai correndo pra tocar o chão. Tirei os meus sapatos fechados, estendi os dedos, alarguei os passos e pisei na terra laranja, sujando meus pés limpinhos com deboche e carinho. Depois achei uma poça d’água e coloquei os pés pra enxaguar. A cor laranja se espalhou pelos poros, pelos pés, pernas e canelas... 

Agora eu sabia, de verdade, o prazer que era!


 

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quinta-feira, 10 de junho de 2021

O REMENDO XADREZ


Eu não gostava dos rojões. Dos estalos. Da explosão! Gostava do cheiro da festa junina. Cheiro de pólvora. Fumaça. O ardido nas narinas... Até hoje, isso me lembra um tempo feliz. Festa simples. Gente simples. Do interior caipirês do nosso país.  

E todo ano era igual. Já em maio, as professorinhas, dedicadas, começavam a combinar. Não havia muito o que mudar. Compravam as sedas. Faziam as bandeirinhas. Colavam no barbante. Vermelhas. Amarelas. Azuizinhas. Os meninos subiam nas escadas para enfeitar. O pátio do colégio ficava alegre. Com bandeiras, balões e fogueira. Sem fogo. Só toras de madeira. Tudo no centro da quadra de esportes, dando ar de São João. Era lá a quadrilha. Iam todas as famílias... 

Os ensaios começavam um mês e meio antes. Cansativos, mas divertidos. Dava pra matar umas boas aulinhas. Com o consentimento raro das professorinhas, que também dançavam festivas. Sofrido mesmo era ouvir durante horas e horas a mesma trilha sonora. Talvez a única música junina do mundo inteiro, tiro certeiro: Pararararararará... E lá ia a gente montar a quadrilha. Olha a chuva. Olha o túnel. Olha a cobra... 

E se de um lado a festa dava trabalho, de outro era mágico e engraçado. Ter um dente pintado, estragado, bem na frente da boca era o sorriso desejado. Calças de jacu nos garotos. Nas meninas, vestidos de chita com fitas e cores esquisitas. Vixe, como era "bão"! Remendos na roupa, então...  

Lembro uma vez, eu já tinha uns dez anos... Fui escolhida, pela terceira vez, para ser a noivinha. Talvez pelo fato de ser pequenina. Cabelos grandes. Sei lá... O fato é que eu e o meu parceiro Paulo José Barreiro (não sei porque as crianças lembram o nome inteiro dos amigos que há mais de quarenta anos conheceram...) fomos escolhidos, mais uma vez, para sermos o casal. 

Brava,  já em casa, expliquei para minha mãe quase chorando : - Mais uma vez, eu de noivinha! – Mas a noiva é a principal. Você não gosta dessa honradez?  - Mãe, será que você não entende... Eu gosto de remendo. Remendo xadrez!  Noiva não usa remendo xadrez...

E aquele cheiro de pólvora, voltou, subitamente, às minhas narinas...



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