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terça-feira, 28 de fevereiro de 2023

NEW ORLEANS... NUA E CRUA!


Quando visitei pela primeira vez o French Quarter, o famoso quadrilátero francês, de lindas casinhas e varandas floridas, não imaginei o impacto que teria na minha pacata vida. 
Avesso à beleza americana de comportamento, em New Orleans as coisas não funcionam muito bem. Estacionamentos com filas desorganizadas. Máquinas de gelo que acionam com pancadas. Gente bebendo pelas ruas em vinte e quatro horas de baladas. Copos e papéis no chão. Lembra, por vezes, o nosso Brasil gentil. Ah, mas ouve-se jazz em todos os cantos! E este sim, é um diferente encanto...

Entramos num efervescente pub do quarteirão para pedir um sanduiche de camarão e ouvir uma "traditional song". Vozes nativas e melodiosas soavam acompanhadas por instrumentos surrados. Nas esquinas, no chão e sentados, artistas tocavam por trocados.  

Em meio às cornetas do Mardi Grass, tentativa pálida de carnaval americano, passeavam tradicionais famílias que adentravam as charutarias, lojas de vodú e magia. Executivos comportados espiavam atrás dos biombos nas ruas, mulheres dançantes e nuas. Quase todos com  “hurricanes”, bebida azulada que exalava fumaça por todos os lados, inebriando ainda mais as ruas estreitas com cheiro de pecado... 

Fechando de forma mais estranha a nossa visita "Orleana", um alegre senhor cheio da grana,  no meio da rua começou a gritar... “ Show me your tits! I’ll give you a bead” -Mostre os seios e eu te dou um colar! 

No alto das varandas, mulheres bem vestidas e lindas começaram a levantar suas blusas para mostrar os seios fartos, em trocas de simples colares de contas coloridas...

Voltamos em silêncio. Estremecidos. Imaginando não mais voltar àquele local onde o mundo parece ter parado, pirado ou algo parecido. Nada disso. Voltamos no dia seguinte. Com roupas extravagantes. Compramos hurricanes, charutos e seguimos curiosos e fascinados pelas ruas nuas e cruas de New Orleans, agora sem muito pudor. 

Afinal, sair do sério, uma vez na vida... é libertador!
 

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OBRIGADA PELA VISITA!

terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

RENDIDA AOS SEUS PÉS...

Os patolas de pés azuis tem os pés da cor celeste para encantar as fêmeas da sua espécie. Fiquei apaixonada assim que vi. Se eu fosse uma patolinha fêmea cairia aos pés de um deles e seria fácil presa com vontade de procriar e encher a casa de patolinhas azuis beleza. Que maravilha a natureza e o poder de atração dos bichos. Perpetuação da espécie. Truques biológicos pra fisgar o seu par na época de acasalar.

Certos machos mudam a coloração para atrair suas parceiras. Uns apresentam cores mais fortes e intensas. Outros exalam hormônios e fortes cheiros. Há os que gritam para chamar a atenção. No karaokê da floresta, a araponga da amazônia é a número um, com seu canto que alcança 125 decibéis, mais que o som de uma turbina de avião. Haja ouvido pra tanta paixão.

Outros fazem a dança do acasalamento para completar o flerte e deixar a fêmea desnorteada.  Elas caem facilmente nas trucagens do namoro. Depois do acasalamento, a maioria retorna a ser cinzento, coisa comum na maioria dos longos casamentos.

A atração nos humanos é um pouco diferente. Alguns até colocam tatuagens e piercings para mostrar o corpo sarado e sexualmente preparado. Para alguns e algumas, dá resultado. Afinal, se os machos humanos abrissem penas coloridas com olhinhos de seda como os pavões na dança nupcial seria estranho, anormal. Nas costas então, pareceriam anjos. Imagem sagrada, sem conexão sexual. Melhor ser atraída pelo bom canto. Como não se apaixonar se Fred Mercury começasse a cantar Bohemiam Rapsodhy para nos conquistar?

Há diversas formas de encantar as fêmeas humanas. A beleza, a gentileza, os órgãos, a inteligência, o cheiro, o coração...

Não sou patola fêmea embora quase me deixei seduzir pelos pés azuis celestes dos machinhos penados.

Como fêmea humana que sou, confesso minha atração por algo bem particular. Eu me rendo e me entrego quando leio o desejo... no olhar!


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quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

OS LENÇÓIS DE CAMBRAIA!

Ela guardava os lençóis num baú de madeira muito bem polido com óleo de peroba. Tinha detalhes em dourado na bonita fechadura com cadeado. Ficava no sótão no alto do sobrado. Eu nunca vi aberto. Sabia por alto e em retalhos de conversas, dos seus tecidos finos que embalavam o meu imaginário...

O enxoval vivia no baú desde seu casamento. Eu pescava aqui e ali algumas pistas do seu rico conteúdo. Bordados ingleses, crochê, guipir, matelassê, lindas toalhas e os... cobiçados lençóis de cambraia. 

Hilda era referência no bairro. Conseguiu formar três filhos doutores em plena década de sessenta, onde a maioria virava trabalhador operário. O seu sobrado era simples. No interior, uma boa mobília e presentes de família... Um piano que o filho mais velho comprou. Um vaso italiano de murano. E fotos da viagem à Europa que o filho do meio a levou. Veneza! Paris! Moscou!

Os filhos da Hilda eram tão exaltados que em nossa casa virou uma espécie de bordão, carregado de ironia. Se algo extraordinário acontecia... Foram os filhos da Hilda! A gente dizia...

No ano passado saímos de férias para Jurerê. Sem reservas de hotel, no mês de fevereiro, procurando um bom aconchego. Paramos numa pousada pequena e da praia um tanto distante. A piscina pequena lembrava um tanque. O quarto diminuto. A dona anunciou o preço absurdo... 700 reais a diária!

E toda empinada, olhando para a cama king arrumada, a senhora completou... Aqui a diária é mais cara.  Os lençóis... são de cambraia!

 

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E aguarde novidades...




 

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

A SABIÁ NA TELHA...

Não passava das cinco e meia. A sabiá laranjeira voltava pra sua casa entrando na fresta da telha. Eu olhava de baixo, sentada na grama verde do jardim. Como vive aquela passarim? É lá dentro que ela mora. Deve ter cama de capim. Será que tem mesa de madeira? Fogãozinho a lenha? Luz de fósforo imitando lampião?

Na minha Liliputi da imaginação, eu tinha seis polegadas e entrava na casa para espiar a ninhada, olhar a mobília da passarada, ir até o fundo de telha, vasculhar a cozinha...

Eu fazia comidinhas invisíveis para o meu pai, de criança. Era uma espécie de culinária imaginária. Ele fazia o pedido do dia. Eu anotava. Ia numa espécie de copa secreta e preparava com ingredientes mágicos. Punha sal, orégano, pouco  alho. Não exagera na pimenta, meu pai pedia! Eu sorria e tirava com os dedinhos, o excesso da ardida vermelhinha.

Em poucos instantes eu voltava radiante trazendo o pratinho invisível.  Ele comia e se derretia.  Quer sobremesa? Pudim de leite! É pra já. Eu voltava com manjar. Não temos  pudim hoje, não faz mal? De jeito nenhum.

No final eu trazia a conta. Ficou dois Reais! Eu pedia pouco. Pegava o dinheiro invisível e ainda ficava com o troco.

Meu pai saía para o trabalho e eu voltava pra minha telha. Meu ninho dentro de casa. Um mágico e minúsculo mundo onde tudo eu inventava.

Quando a nossa casa foi pintada, a escada dupla do pedreiro ficou no jeito certo. Não havia ninguém por perto. Eu fui subindo degrau por degrau para espiar a telha habitada, pensando encontrar  a sabiá e seus pertences, montinhos de capim e quem sabe, uma ninhada recente.

Nada. A sabiá tinha se mudado. Uma outra visitante com mania de limpeza ocupou o espaço... Eu também cresci. Olhava menos pro alto. Tudo que eu vi no buraco da telha, foi uma minúscula abelha, passageira...

Lambuzada e com ar de apressada, esfregava o rosto e as mãozinhas... orando e se limpando, limpando, limpando...


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quarta-feira, 1 de fevereiro de 2023

A PEDRA CONFIDENTE...


Todas as manhãs eu levantava cedo e caminhava até minha pedra predileta. Da minha maneira, discreta. Ficamos frente a frente na areia. Eu falo dos meus problemas. Minhas noites não tão serenas. Minhas dúvidas e hesitações. Ela fica quieta. Feito pedra, apenas escuta. E aceita minhas confidências, muda. Entendo quase sempre que eu devo me virar sozinha e sem sua ajuda.

Às vezes, ela espuma com minhas loucuras. Outras vezes, me varre pra frente com uma onda forte que alça meu corpo e alma em solavanco de repente. Nos entendemos desse jeito. Eu sempre obedeço. Ela é milenar. Deve saber mais.

Desde a infância eu já gostava de conversar com os mais velhos. Contava histórias para as professoras. Falava com os adultos da vizinhança. Afagava os cãezinhos idosos com natural compreensão. As peças antigas da casa também me diziam coisas. Os pratos antigos da cristaleira tinham para mim a memória das lambidas das crianças. A saliva das bocas dos que ali se fartaram. E babaram. O ranger dos garfos e facas das fortes mãos que riscos e sulcos deixaram. As coisas velhas absorvem passado.

Fui até a pedra estes dias, em busca de um bom conselho. Um caminho pra seguir em pé nestes dias de desânimo e destemperos. Olhei para o seu topo e desconfiada encarei a estátua do alto da pedra que me olhava. Estátua da feiticeira. Bem mais nova que a pedra e mais faceira.

Eu que confessei à pedra tudo que minha alma sentia, não reparei que outra figura por perto ouvia... Olhei a estátua e imaginei uma piscada.

Será que era com a pedra... ou com a feiticeira que eu conversava?

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Nota : a pedra da feiticeira é uma pedra arredondada que fica na ponta oeste na praia de Itararé em São Vicente, litoral de São Paulo. A pedra tem fama de mística e possui uma estátua de feiticeira no seu topo.

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