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domingo, 5 de maio de 2024

O NOME DA MÃE

Ela dizia que nem nome tinha. 

Os imigrantes portugueses que chegaram ao Brasil no começo do século passado tinham fama de atrapalhados. Alguns fatos na minha família reforçam essa pecha de forma irretocável.

Por distração ou esquecimento, meu avô só registrou minha mãe depois de um ano de seu nascimento. Levou junto a filha mais velha ao cartório e ao ser perguntado qual o nome da menina, disse Zilda, referindo-se a filha que trazia pelas mãos. Conclusão: a menina mais nova, minha mãe, que todos em casa já chamavam de Olga, foi registrada com o mesmo nome da minha tia, Zilda.

Meu avô, ao chegar em casa, consertou prontamente o engano do seu jeito prático-lusitano. Riscou com um lápis o nome Zilda, escrito à máquina no documento corrigindo por cima, Olga. E deu-se por satisfeito.

Anos mais tarde, só quando ingressou no colégio, minha mãe descobriu que não se chamava Olga, mas na verdade, Zilda. E foi assim que os colegas de classe e os professores passaram a lhe chamar. Era seu nome oficial a partir daquele dia, usado em crediários de loja e documentos oficiais. Mas para a família, continuava a ser a Olga, a Olguinha. Zilda sempre foi e será a outra filha. Ora pois, não é vovô? Quem é que não sabia?

A confusão aumentou quando saíram os proclamas do seu casamento no jornal. Meu pai foi avisado pelos amigos do bairro. Corre lá, Sylvio, avisa que tem coisa errada. Estão te casando com a tua cunhada! Como bom italiano, irônico e sorridente meu pai explicava o incidente.

Por essas e outras, minha mãe dizia ter tido tudo na vida, família, filhos e filha. Mas que nome de verdade, de verdade ela não tinha. Não era Olga. Nem era Zilda! 

Quando fez seu livro de poesias não sabia o que colocar. Quem sabe uma composição? Mas Zildolga, convenhamos, não seria a melhor solução.

Hoje que ela já se foi, eu sei ao certo seu nome. Podia ter sido Olga, Zilda, Lia, Tereza, Eduarda. Cumpriu tão divinamente sua maternal jornada que seu nome no livro pouco importava. 

Eu a chamava de Mãe. Mãe com maiúscula. Porque Mãe lhe cabia e bastava. 

Mãe, lhe batizava! 

          *             *

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