Páginas

quarta-feira, 19 de agosto de 2020

É NA RUA JAVARI?


 
                                                                                                         
Eu via o jogo de semifinal da Champions League na tevê. Mais de cinquenta mil torcedores no Camp Nou, quando minha mãe, do alto dos seus oitenta anos, me perguntou onde era o jogo. - É na rua Javari?
 
Carinhosamente respondi que não, enquanto invadiam minha alma, as doces lembranças da Moóca antiga e em minha boca eu sentia a doçura dos cannolis que só lá, na Javari, saboreei igual. Meu avô tinha uma venda colada ao Estádio, de nome Rodolfo Crespi. Campo pequeno, com uma arquitetura pra lá de charmosa que lembrava os estádios da Inglaterra.
 
A venda era de secos e molhados. Na verdade, minha avó era quem fazia de tudo. Do famoso sorvete de ameixa, às tradicionais alheiras portuguesas que ficavam penduradas defumando e dando ar de empório antigo ao local.
 
O meu avô também ajudava, do seu jeito, tocando bandolim em frente à porta e nos domingos à tarde, assistia ao jogo do Juventus. E ele tinha uma maneira bastante peculiar... Colocava uma escada e subia na parte de trás da casa, numa espécie de laje, onde aprumava sua cadeira e sentado ao contrário, com sua camisa grená, torcia pelo “Moleque Travesso”. E o moleque adorava ganhar dos grandes, em especial do meu timão.

Era a grande diversão do vô Henrique e assunto pra toda semana na venda. Nunca perguntei se ele chegou a ver o famoso jogo entre Santos e Juventus, onde Pelé fez aquele que foi considerado o gol mais bonito de sua carreira, com uma sequência de três chapéus e toque de cabeça pra cima do pobre goleiro Mão de Onça.
 
Mais de duzentas mil pessoas disseram que estavam lá naquele domingo à tarde, na pequena Javari. Mas o meu avô, ele sim, deve ter visto. 
Lá no telhado, e de camarote!
 
Acho que minha mãe estava certa. Nada de Camp Nou, nem Champions League. Jogo bom, de futebol, aos domingos... Jogo duro de verdade e com time pequeno aprontando pra cima dos grandes, só na Javari mesmo!

E os cannolis, vira e mexe, invadem minha mente de doces lembranças.

******
 
           
  *               *                                                                                  





         

A FUGA DA BAILARINA...


Eu tinha uns quatro anos de idade quando ganhei a caixinha de música. Quadrada e delicada. De veludo vermelho, forrada. Atrás, um espelho. E uma linda bailarina com os pés grudados que, ao abrir a caixinha e ouvir a valsa, girava no seu pequeno palco. 

Eu não sabia se a valsa era russa ou vienense. Tchaicovisky ou Strauss. Talvez a bailarina soubesse. Seu andamento era perfeito. Rodava delicada, encaixada no movimento. Eu, nem sabia falar bailarina direito. Apenas abria a caixinha e olhava a moça girando com magia e sua saia de renda curtinha.

Eram leves e finas as mãos da bailarina. Usava sapatilhas, mas não machucavam o calcanhar. Não era todo dia que eu a punha pra dançar. Tínhamos o nosso compromisso velado. Geralmente, nas noites de sábado, antes de me deitar.                                                                 
Eu abria a caixinha e revia minhas frágeis bijuterias. Anéis de vidro, colares brilhantes. Nada de ouro ou diamantes. Enfeites de menina. Eu gostava mesmo era de olhar a bailarina. Ana Sophia, apelidei. Achei nome de princesa. Combinava com cena de realeza. Música, espelho e um majestoso tapete vermelho.

Mas bateu, de repente, uma profunda tristeza. Senti a bailarina ali tão presa. Dançava apenas quando eu abria. Eu que decidia. E quando a esquecia trancada, ela apenas adormecia.

Deixei a caixinha aberta noite e dia. E antes de dormir, olhava a bailarina e lhe pedia, que escapasse pela janela e só voltasse no outro dia. Assim, veria enfim, a bailarina em sua maior evolução. 

Na valsa da libertação!



*                                  *                                                                      


VEJA, AGORA, AS CRÔNICAS FALADAS NO YOUTUBE!

RELAXE SUA MENTE!


quarta-feira, 12 de agosto de 2020

FANTASMAS CAMARADAS...


Bastava a noite chegar e a escuridão ir se debruçando pelos cantos das ruas e nos vãos das casas. Quando tudo começava a se acalmar e o silêncio tomava conta da sala, do quarto, das portas e armários. Na hora que a TV desligava no automático... eu começava a ouvir os ruídos abafados...

Pareciam passos. Com pequenos intervalos e espaços. Movimentos finos de um pisar cuidadoso. Começava o passeio pelo forro. Eu cobria a cabeça com receio, encolhida no travesseiro.

Os passos seguiam até o banheiro, num tique-toque intermitente. Pés de fantasma ou de gente? Eu dormia com medo. E quando amanhecia tudo voltava ao normal. Nada fora do lugar. Eu deixava pra lá.

No mês passado a chuva forte veio. Selou e envergou o telhado no meio. Chamei o Cláudio para dar um jeito... Melhor tirar as telhas e promover um grande conserto! Muita água anda descendo. Aproveita e vê o que tem lá em cima, pombos, fantasmas, ou curupira. O que achar, você tira! Leva vela, alho, cruz e figa de madeira. Vai nesta sexta feira!

Foi só o Claudio subir no final do entardecer para o fantasminha aparecer. Um não, quatro! Uma família inteira de Saruês. Um tipo simpático de gambazinho pelado do mato. Foram descendo... mamãe, papai, o filhão e a filhotinha. Um a um pela árvore fininha. A mamãe gordinha, o papai mais lento e os filhotes jovens e prováveis barulhentos.

O Cláudio veio com a vassoura, o vap e a marreta. Está louco, Claúdio? Não faça nada no telhado agora. Eles moram aí. Bolsa família! Acabei de instituir! 

Esse Cláudio...


**********


AGORA, TEM O CANAL INESPLICANDO NO YOU TUBE

DÊ UMA ESPIADINHA... E CLIQUE EM SEGUIR!

VEJA OS CLIPS,  POESIAS, DESAFIO LETRA E CRÔNICAS FALADAS...



OBRIGADA!