Eu tinha uns quatro anos de idade quando ganhei a caixinha de
música. Quadradinha e delicada. De veludo vermelho, forrada. Atrás, um espelho. E uma linda bailarina com os pés grudados que, ao
abrir a caixinha e ouvir a valsa, girava no pequeno palco.
Eu não sabia se a valsa era russa ou vienense. Tchaicovisky ou
Strauss. Talvez a bailarina soubesse. Seu andamento era perfeito. Rodava tão delicada, encaixada no movimento. Eu nem sabia falar bailarina direito... Apenas abria a caixinha e
olhava a moça girando com magia e sua saia de renda curtinha.
Eram leves e finas as mãos da bailarina. Usava sapatilhas, mas não machucavam o
calcanhar. Não era todo dia que eu a punha pra dançar. Tínhamos o
nosso compromisso velado. Geralmente, nas noites de sábado, antes de me deitar. Eu abria a caixinha e revia minhas frágeis
bijuterias. Anéis de vidro, colares brilhantes. Nada de ouro ou
diamantes. Enfeites de menina. Eu gostava mesmo era de olhar a bailarina. Ana
Sophia, apelidei. Achei nome de princesa. Combinava com cena de realeza. Música, espelho e um majestoso tapete vermelho.
Mas bateu em mim uma profunda tristeza... Senti a bailarina ali tão presa. Dançava apenas quando eu abria. Eu que decidia. E quando a esquecia trancada, ela apenas adormecia.
Deixei a caixinha aberta noite e dia. E antes de
dormir, olhava a bailarina e lhe pedia que escapasse pela
janela e só voltasse no outro dia. Assim, veria enfim, a bailarina em sua maior evolução.
Dançando a valsa da libertação!
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Nestes tempos de tantas regras e proibições, pensar na bailarina presa na caixinha de música e no seu desejo de a libertar, tão pequena...
ResponderExcluirSempre muita sensibilidade ..