Noite de fogueira. Depois da
chuva forte da semana inteira. Sacamos do armário os velhos chapéus de palha e
roupas remendadas, aquecidos pelas lembranças das festas da infância. A nossa chama estava viva.
Os vizinhos da rua recolheram as toras de madeira nos terrenos vazios, deixando numa espécie de quintal de teto coberto. Três dias seriam um bom tempo para o secamento.
As bandeirinhas em papéis de seda lembravam Volpi nos postes, nas árvores, num alegre ziguezague. Rua fechada. Carro nenhum passava. Havia um clima de interior. Divisões de tarefas nos pratos da estação. Maria, caldo verde, Tereza, o milho, Tio João, o quentão.
Sábado veio e o céu anoiteceu. A noite caipira foi se enchendo de estrelas. São límpidas as noites frias de inverno. Brilhantes, como se Deus tivesse lavado as estrelas e pintado a lua de um branco fosforescente.
No meio da rua, a fogueira armada. De quatro em quatro, as toras empilhadas e ligeiramente úmidas davam certa apreensão. Só o fogo ardente daria vida à calorosa atração.
Começaram as tentativas. Um fogo pálido surgia e sucumbia. Álcool, abanos, gravetos fininhos. Nada adiantava. As crianças decepcionadas começaram a brincar de bola. Outros não ligaram, bebiam e conversavam. João pegou a viola.
Às duas da madrugada não havia mais nada. Nem gente ou comida. Nem fogueira e criançada. Sentamos resignados na frente das toras ainda inteiras e a viola tocou a última moda...
De repente um clarão de arrepiar. Estalos, crepitar. A chama forte começou levantar. A luz do fogo que hipnotiza. Ígnea viva que queima os afoitos. Acendeu os sonhos dos poetas e dos loucos.
Ficamos olhando a fogueira até o
dia clarear.
Mas muitos não viram. Dormiram.
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