Era um peso danado ser
a primeira da classe. Eu carregava um misto de vaidade com aborrecimento. A auto-exigência
de ter as melhores notas, o melhor comportamento. Pra que tanta cobrança assim, pequena curumim? Hoje, não cobro nada tão serio de mim. Fui assim até meus
dezesseis ou dezessete anos. Eu mirava a perfeição. Nove, eu aceitava. Oito,
era decepção.
No dia da bandeira, a escola inteira se preparou
para a festa. Enfeites, bandeirolas, fitas, professorinhas ufanistas. E eu, a primeira
da lista. Escolhida para declamar a poesia de Manoel Bandeira. Foram dias e dias
ensaiando café com pão, café com pão, café com pão. Virgem Maria que foi isso
maquinista? Agora sim, café com pão, café com pão. Eu torrava o pão e a paciência dos meus
irmãos, recitando em casa, o trem da repetição. Café com pão, café com pão. Eu
queria a perfeição. Eu era tão exigente...
No dia da festa, o que era certo entortou. Perdi a
hora. O despertador falhou. Às sete, a
cerimônia começava. Levantei sete e meia passada. Saímos, minha mãe e eu, em
disparada. Roupas, às pressas colocadas,
cabelo mal penteado, cara mal lavada. Corremos pelas ruas, desvairadas. Passa poste, passa boi, passa boiada... Era o
próprio trem de ferro em disparada para conseguir chegar ao menos antes da festa
terminar. Eu, que era tão exigente...
Ao nos ver no
portão da escola, com ar de súplica e esbaforidas, Dona Margarida, minha
generosa professora pediu à diretora que
encaixasse minha apresentação antes de encerrar a manhã festiva. E lá fui eu na frente de todos, reunindo a
coragem que restava e com toda a força na fornalha, declamei o poema, sem muita
interpretação...
Café com pão, café com pão, café com pão! Piuiii... Todos
aplaudiram. Cantaram o hino, enquanto eu olhava no alto do mastro, a bandeira verde
amarela que como eu, ainda tremulava.
Teria sido uma vitória. Não para mim.
Eu me daria uma nota três. Eu era
tão exigente...
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