Eles já estavam separados há muito tempo. Ele de um
lado. Ela, o mais distante possível. O mais engraçado é que não se separavam.
Pelo menos no papel, ainda eram casados. Bodas de ouro indo pra diamante. Mas
continuavam distantes. E assim queriam ficar...
Vivi no meio dessa separação
durante quase toda infância e um bom pedaço da adolescência. Santa resistência.
Numa verdadeira trincheira ouvindo cada lado reclamar... - Quem falou ? Aposto
que foi teu pai! - Quem disse? Foi sua mãe, pode apostar... E assim viveram por
longos anos. Em perfeita e harmônica relação. Cada um no seu canto. Casas
diferentes. Sem divórcio. Só física separação.
Até que um dia os dois, distantes, cismaram de ver a mesma novela. Coincidência
intrigante. Misteriosa. O Cravo e a Rosa! Sentavam-se todas as tardes em frente à tevê. Cada qual na sua casa. Ambos já aposentados. E punham-se alegremente a ver, divertindo-se um bocado... Ele adorava a Catarina. Ela amava o Petrucchio. Ela é
dura na queda, ele dizia. Ele é turrão, ela se derretia!
Novela de época.
Época dos meus pais. Geração dos anos trinta. Dos romances difíceis e muitas vezes proibidos. Virgindade, pudores e medos. Casaram-se tão cedo! Dezoito e dezenove
anos. Nenhum dava o braço a torcer. Discutir relação, jamais. Perdoar? Nem
pensar. Ainda mais, traição! Catarina, nunca. Petrucchio, não! Eram iguais. Ela dinamite. Ele explosão. E viviam
se odiando, com muita paixão!
Eles não perderam
um só capítulo no Vale e Pena Ver de Novo das tardes quentes daquele verão.
Sentavam-se, cada um na sua casa, em frente à televisão. Feito a nona e o nono.
Cada um no seu canto, solitários. Relembrando a juventude e os erros do passado.
Mas torciam juntos por um final feliz...
Na novela aconteceu! O cravo ficou
com a Rosa. Felizes para sempre. Mas com meus pais, foi diferente. Continuaram
separados e reclamando até o fim.
Por isso, hoje, não tenho cravos e rosas nos
vasos e janelas. Tenho lírios e bromélias. Vivendo juntos e em paz.
Nunca
gostei de novelas. Mas tenho uma saudade
daquelas... Justo daquela!
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Verdade. Qta gente assim..se odiando com paixão, como se bem no.fundo ainda se amassem pelo menos um pouquinho.. ou muito. Quem sabe.
ResponderExcluirInês Bari. sempre espiando e compreendendo a alma humana.
Compreender nem tanto.. "inesplicar", talvez!!! beijos Soninha!
ExcluirMuito bom!
ResponderExcluirTambém adorei essa novela, foi uma das últimas que acompanhei Gostei da ideia dos "lírios e bromélias"!
Talvez tenha sido o jeito deles se amarem, nem devem ter percebido esse distanciamento.
ResponderExcluirVai saber!