Ela subia num degrauzinho de madeira para ficar mais alta e ajudar por alguns minutos no caixa.
A venda da Dona Emília era daquelas
antigas, com prateleiras de madeira escura, grandes sacos de juta com bordas
enroladas, cheios de arroz, feijão e milho em grãos. Latões de óleo. E uma
vitrina de doces coloridos que juntava crianças feito formiguinhas no
açucareiro.
Na lousa preta, na porta principal da venda, escrito
com giz, o chamariz. "Aqui tem. O melhor sorvete de ameixa do Belém!" Devia
ser. Aos sábados fazia fila na venda da Dona Emília.
A casa da família era no andar de cima e perto do meio dia, minha vó subia para aprontar o almoço, entornar as ameixas no leite cremoso e fazer mais um latão do sorvete famoso.
O avô, que tinha
levantando às três da manhã para comprar as mercadorias, acordava a contragosto
e descia para tomar seu posto, até minha mãe, pequenina chegar e se oferecer para ajudar.
As meninas do bairro só pensavam nos vestidos e nos
cabelos de domingo. Minha mãe continuava no caixa, lendo um livro ou um gibi. Foi
assim até a adolescência. As meninas liam revistas. Minha mãe, Machado de
Assis.
A revista Cruzeiro com as estrelas de Hollywood definia a roupa e os cabelos da moda. As costureiras do bairro trabalhavam para reproduzir igualzinho, encontrando os tecidos perfeitos.
Minha mãe escolhia um
vestido antigo que não servia mais para a irmã mais velha e vestia. Dona Emília
ajustava no corpo com a ajuda da velha máquina de costura. Mas o cabelo era a
parte mais dura. Não tinha paciência, nem desenvoltura.
Algumas garotas contavam seus cento e vinte cachinhos.
Sessenta pra cada lado. Ou nem saiam para o desfile de sábado. Ser "Shirley
Temple" ( foto) dava um trabalho danado. A manhã inteira com bigudins pendurados, pensando nos cachos e nos futuros namorados.
Poucas horas antes do "footing", minha mãe largava os livros e corria para fazer seus oito cachos. Quatro pra cada lado. Nada mais. A tarefa a aborrecia demais.
Pouco antes de sair ela soltava as madeixas. Os
cachos lambidos escorriam da sua cabeça. Ela sorria. Não ligava. Não combinava
com as duras cabeças empoladas.
Meu pai, um dos rapazes cobiçados do bairro do Belém, disse certa vez o que viu de diferente na minha mãe, no meio de tantas divas hollywoodianas com seus cabelos de spray.
Sua mãe tinha a justa medida. No vestido simples, o corpo bonito transparecia. Sua boca alegre sorria.
E o cabelo... ah, o cabelo, natural e leve. O vento desenrolava e ele bailava... e se mexia! O cabelo também sorria.
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Novidades Inesplicando!
EM BREVE...
AGUARDE!
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