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segunda-feira, 26 de junho de 2023

NÃO VOU ESTRANHAR O CÉU...


Não vou estranhar o céu. Está ficando parecido com o meu paraíso. Tem chegado gente de prestígio. Pelo menos, pelo meu crivo, cultural, pessoal, esportivo.

Já tinha um bocado de gente fina. Em cada canto, alguém por quem eu derramei meu pranto, meu canto e teria tanto à agradecer. Alguém por quem rezei e chegou lá celebrando. Senna, com a bandeira na mão tremulando. Pavarotti, estremecendo as nuvens com seu canto. Elis Regina, Cazuza, Cauby, Elza, Ângela Maria e Aguinaldo.

Não vou estranhar o céu... imagina! Tem numa esquina Clarice, Drummond, Coralina, Suassuna. Coisa de Deus. Poesia pura. Tem Cecília, Machado, Graciliano, Manoel de Barros. Veríssimo pai. Eu teria infinitos dias para ouvir suas histórias, que agradam agora até Nossa Senhora.

Na praça de esportes celestial, Garrincha, Zito, Carlos Alberto e Telê. Cruyff, Euzébio, Puskas e Pelé. Só olé. Nesse campo, a palavra não enrola. Falam a língua dos deuses da bola. Chegou também Kobe Bryant, veio com a filhota e ficam encestando nos arcos da glória.

Não vou estranhar o céu. Tem nuvem de samba com Carmem Miranda. Chegou a Nâna e foi recebida pela Clara, Beth Carvalho, Ataulfo e Noel. Chegou a Marília Mendonça, vinda direto do céu. Chegou de avião, antes da hora prevista. Foi muito bem acolhida.

E vem vindo gente todo dia. O último baiano que eu lembro foi Moraes Moreira. Depois chegou Gal, no mesmo dia que o Boldrin. Quantas noites eu ficaria sem dormir, ouvindo os dois cantando e proseando nos bancos celestes dos jardins.

Quincy Jones chegou faz um tempo e começou produzir o Michael, o Prince e alguns brasileiros... Erasmo e Rita Lee. No céu há músicos aqui e ali. E gente boa de texto e humor.

Ziraldo, o velho maluquinho também chegou. Boa praça. Já está caricaturando os amiguinhos. Ilustrando o céu com sua graça e pondo panelas na cabeça dos anjinhos. 

Não vou estranhar o céu. Está ficando muito familiar. 

Já tem meu pai, mãe, tios, prima, avó e irmão. Todos estão por lá! E aquele meu receio de bater com as botas? Ir pro beleléu?

Isso já foi também. Não vou estranhar o céu. Aqui é que ando deslocada,

nesta cada dia mais desvairada — torre de babel!


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sábado, 10 de junho de 2023

A ÚLTIMA CHAMA DE SÃO JOÃO...

Noite de fogueira. Depois da chuva forte da semana inteira. Sacamos do armário os velhos chapéus de palha e roupas remendadas, aquecidos pelas lembranças das festas da infância. A nossa chama estava viva.

Os vizinhos da rua recolheram as toras de madeira nos terrenos vazios, deixando numa espécie de quintal de teto coberto. Três dias seriam um bom tempo para o secamento.

As bandeirinhas em papéis de seda lembravam Volpi nos postes, nas árvores, num alegre ziguezague. Rua fechada. Carro nenhum passava. Havia um clima de interior. Divisões de tarefas nos pratos da estação. Maria, caldo verde, Tereza, o milho, Tio João, o quentão.

Sábado veio e o céu anoiteceu. A noite caipira foi se enchendo de estrelas. São límpidas as noites frias de inverno. Brilhantes, como se Deus tivesse lavado as estrelas e pintado a lua de um branco fosforescente.

No meio da rua, a fogueira armada. De quatro em quatro, as toras empilhadas e ligeiramente úmidas davam certa apreensão. Só o fogo ardente daria vida à calorosa atração.

Começaram as tentativas. Um fogo pálido surgia e sucumbia. Álcool, abanos, gravetos fininhos. Nada adiantava. As crianças decepcionadas começaram a brincar de bola. Outros não ligaram, bebiam e conversavam. João pegou a viola.

Às duas da madrugada não havia mais nada. Nem gente ou comida. Nem fogueira e criançada. Sentamos resignados na frente das toras ainda inteiras e a viola tocou a última moda...

De repente um clarão de arrepiar. Estalos, crepitar. A chama forte começou levantar. A luz do fogo que hipnotiza. Ígnea viva que queima os afoitos. Acendeu os sonhos dos poetas e dos loucos.

Ficamos olhando a fogueira até o dia clarear.

Mas muitos não viram. Dormiram.


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segunda-feira, 5 de junho de 2023

PONTINHOS NO OLHAR


Olhei seus olhos. Vi pontinhos.

Seriam três de reticências? 

Desviei o olhar                            

com medo de não ver a certeza. 

Lá dentro, não me encontrar.


Olhei seus olhos. Vi pontinhos.

Seriam passarinhos? 

Voando? Voltando pro ninho? 

Debandariam assustados  

num olhar arregalado.  

 

Olhei seus olhos. Vi pontinhos.

Pretinhas jabuticabas? Sementes de maracujá?

Lançadas na pupila côncava   

que acolhia e semeava

em seu doce curvar.

 

Olhei seus olhos. Vi pontinhos.

Agora eram estrelas. 

Planetas. Meteoritos. 

Meus olhos se perderam 

naquele vão infinito.

                                                             

Moveram-se, enfim, os pontinhos. 

Loucos elétrons girando

numa órbita de amor particular. 

Vi dois seres aflitos                

Prestes a colidir 

e se reintegrar.


Iris e Osiris?

Eu e você?

Eram divinos.

Dançaram e se amaram 

na beira do seu cristalino!


                                        Inês Bari


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